Culpa Exclusiva da vítima
Quando ocorre um
acidente de trânsito com um dos veículos parados, logo se atribui a
responsabilidade ao condutor do veículo em movimento que vinha em sua direção,
ainda que por todos os meios este tenha tentado evitar uma colisão. A alegação
é falta de cuidado e atenção, alta velocidade etc. Todavia, há casos em que a
culpa deve ser atribuída inteiramente e exclusivamente à vitima. É um longo
caminho a percorrer no sentido de comprovar a referida culpa, principalmente
quando os danos são de tal monta que provocam a ira social, mas é um caminho
necessário para fazer a correta justiça.
Vamos
imaginar um veículo quebrado no meio da pista sem iluminação, numa noite
chuvosa e escura, inclusive com os faróis do veiculo apagados e vindo a ocorrer
um acidente trágico, lesionando gravemente o ocupante do mesmo. De quem seria a
responsabilidade?
Ora,
claro está que o veículo que vier a causar o abalroamento culpa alguma terá. É
certo que todo motorista deve dirigir com prudência e atenção, mas mais certo
ainda é que o proprietário ou condutor de um automóvel quebrado em tais
circunstâncias, deve tomar todas as precauções e cuidados para evitar um
possível acidente, colocando devidamente a sinalização de forma a alertar os
demais motoristas. Uma vez desobedecida as normas de trânsito que tratam da
sinalização de veículo em leito viário em caso de parada, deve responder pela
impudência, pois o Código Nacional de Trânsito, em seu artigo 28, regula os
procedimentos a serem tomados quando da necessidade de imobilização temporária
de veículo. “Sempre que for necessária a imobilização temporária de um
veículo no leito viário, em situação de emergência, deverá ser providenciada a
imediata sinalização de advertência, na forma estabelecida pelo CONTRAN”. E
o artigo 225 diz que “deixar de sinalizar a via, de forma a prevenir os
demais condutores e, à noite, não manter acesas as luzes externas ou omitir-se
quanto a providências necessárias para tornar visível o local, quando: tiver de
remover o veículo da pista de rolamento ou permanecer no acostamento”.
Segundo
disposição do artigo 159 do Código Civil, que trata da responsabilidade por ato
ilícito, a culpa se infere pela ação ou omissão do agente
"voluntária" ou que haja, pelo menos, "negligência" ou
"imprudência", implicando na violação de um dever de diligência, ou,
em outras palavras, a violação do dever da previsão de certos fatos ilícitos e
de adoção das medidas capazes de evitá-los.
Portanto,
não há que se falar em culpa do condutor que vier a colidir com o veículo
parado, não existindo nexo de causalidade entre o dano causado e a ação, posto
que se o evento ocorrer por culpa exclusiva da vítima, cessa a responsabilidade
do acusado ante a inevitabilidade, desde que, é claro, este esteja transitando
pelo local de forma totalmente regular, e, principalmente, com velocidade
adequada para a via.
Na lição
de Carlos Roberto Gonçalves em sua obra Responsabilidade Civil, Ed. Saraiva, 6ª
ed., p. 505: “Quando o evento danoso acontece por culpa exclusiva da vítima,
desaparece a responsabilidade do agente. Nesse caso, deixa de existir a relação
de causa e efeito entre o seu ato e o prejuízo da vítima. Pode-se afirmar que,
no caso de culpa exclusiva da vítima, o causador do dano não passa de mero
instrumento do acidente. Não há liame de causalidade entre o seu ato e o
prejuízo da vítima” Carlos Roberto Gonçalves.
Maria
Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil – vol.
7, Ed. Saraiva, p. 37) aponta para o mesmo sentido observando que: “a
responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo entre a ação e o dano.
Se o lesado experimentar um dano, mas este não resultou da conduta do réu, o
pedido de indenização será improcedente”.
A nossa
jurisprudência já se manifestou nesse sentido, entendendo que: “Responsabilidade
civil – atropelamento em estrada de rodagem – Pessoa postada à noite no meio da
via – Circunstâncias que a tornam única culpada pelo acidente. A culpa cabe,
portanto, inteiramente ao autor e ação não podia deixar de ser julgada
improcedente” (RT, 440:74, RT 563:146).
Portanto,
ante a inevitabilidade do acidente e a imprudência da suposta vítima, não há
que se falar em responsabilidades do acusado, seja ela material ou moral, posto que não deu causa à colisão,
ainda que o acidente seja tão grave que venha a ocasionar danos irreparáveis e
permanentes na vítima, uma vez que sem tomar os cuidados necessários e exigidos
legalmente, esta deve responder pela omissão de seus atos.